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quarta-feira, 4 de maio de 2016

Aborto! A-B-O-R-T-O, dizê-lo-lo com todas as letras



Foi isso que me aconteceu, sim. 
Chama-lo-ei pelo nome. Não é a minha estrelinha, nem o meu anjinho, nem nada cor de rosa. Foi um aborto, é assim que chama. Com todos os "o" e "r" que lhe dão um som tão desconfortável. É como as mamas, mamas, são mamas, não são seios nem peitos, nem colo, nem busto. São mamas!! Somos mamíferos.
Um aborto é feio! Dói! No corpo e na alma! Há muito sangue e muita coisa nojenta para se passar. 

Não me interpretem mal, estou a ser parvinha, mas eu posso. Quando passamos por estes desgostos temos um período de carência em que podemos tudo. Pelo menos é assim que eu penso. E como tenho sido exemplar desde o choque do embrião morto, até agora, roçando ligeiramente a *puta* fria e insensível, acho que hoje, sem o dever de mãe (obrigada Mãe pela folga de hoje), com tempo para pensar, posso *cagar-me* no politicamente correcto e escrever para aqui umas baboseiras.
E aviso desde já os leitores mais sensíveis que posso vir a cuspir mais umas asneirolas pelo caminho. Porque me apetece e posso, pronto..
Geralmente começo a ferver e vou acalmando conforme vou escrevendo. A energia vai saindo.. é mesmo assim, assim sou eu.
Adiante.

Ora então que engravidei! E claro que contei a toda a gente assim que ouvi aquele coração a bater! Comprei roupa, escolhi nomes... E voltava a fazê-lo.
Se estou feliz e me apetece partilhar a minha felicidade com os amigos e família, assim seja. Foram eles que me confortaram quando precisei. Obrigada.

Se há coisa que continuo sem perceber é a meta das 12 semanas. Vou traduzir: Dos 3 meses. No dia 11 semanas + 6 dias não podemos contar a ninguém. 12 semanas: Facebook! Instagram! Pombo correio! Sinais de fumo! 
- "Parabéns!!! Então ontem vi-te á porta da escola do Manel e não me contaste??"
- "Não miga. Só fiz as 12 semanas hoje, miga."
E não se conta porque há o estigma do "tudo pode acontecer". Correcto. Mas... bem vindas à maternidade: infelizmente, tudo pode acontecer, todos os dias, para sempre. Não tenhamos medo de dar explicações, de viver cada momento feliz desde o primeiro dia!! O mais certo é correr tudo bem! Aproveitem cada segundo! 


Ninguém fala de abortos. Dos abortos no primeiro trimestre de gravidez. (dos outros nem sequer quero pensar... é demasiado cruel)
Até falam, nos 122 fóruns de mães e grupos de apoio de facebook, sob pseudónimos. Ninguém conta a um amigo que sofreu um aborto se nunca souberam da gravidez. Isso traduz-se em quê? Na visão perfeita da mulher, gravidez e maternidade.
É como quando estamos grávidas, só nos falam das coisas boas, depois damos connosco sentadas na sanita a lutar contra uma hemorróida e a pensar "MAS PORQUÊ EU???" como se fosse um sofrimento só nosso e transcendental, quando mais de metade das grávidas já passou por isso. (por acaso eu não! WIN! mas tive outras maleitas igualmente degradantes..)

Eu sabia que podia sofrer um aborto. Também sei que, se engravidar outra vez, continuo a correr o mesmo risco. Porque em 3 anos de mãe, infelizmente, dei com muitas histórias tristes, desde gravidezes anembrionárias a mortes e enterros de crianças. Do 8 aos 8 milhões. 
Por isso, acontece sim, e eu sabia, e mesmo assim, preferi contar e partilhar com o mundo que a Catarina ia ter a sorte de ter um parceiro!! E preferi dar as explicações e dizer que é assim a vida e que estou bem. E acho que estou.
E sabem o que ouvi em 90% das vezes? "Também me aconteceu", "Também aconteceu à minha mulher", à minha mãe, á minha irmã...

Eu sei que dói, que é frustrante, que magoa imaginarmos uma criança e de um momento para outro termos apenas uma barriga vazia. Mesmo nas primeiras semanas já temos expectativas.. Mas é mesmo assim e não há nada que se possa fazer senão aceitar e andar para a frente.

Ainda assim, a minha opinião é que não se deveria esconder. Nem que seja para que as mulheres que ainda vão passar por um aborto saibam que é comum, é frequente. Acontece e muito! Para que não se sintam "anormais", que falharam ou que fizeram algo de errado.
Não sei se é culpa, medo, vergonha. Qualquer uma das opções, não tem nada a ver! Ninguém fez nada de mal! Ninguém deixou de cumprir o seu objectivo na humanidade! Continuamos mulheres e grandes mulheres!
Não temos de ser perfeitas, nunca fomos e nunca vamos ser. E quem achar que é perfeita é um ovo podre!
Só somos perfeitas no nosso coração de mãe, nem que seja por breves semanas, ou pelo resto da vida. O nosso corpo tem o direito de pensar melhor, reflectir. Ele sabe o que é melhor para nós. Se lhe dermos tempo e confiarmos, ele voltará a fazer o que é suposto. Ou não..
É tão natural o nosso corpo corrigir algo que está errado, ou mostrar que algo está errado, para podermos saber e tratar o problema.

Quando falamos muito nos assuntos, tiramos-lhe a aura de tabu, passam a ser terrestres, nossos. São aceites com mais naturalidade. Custa menos aceitar algo que sabemos que é natural.

Nem todas as histórias tem finais felizes à primeira, às vezes nem à segunda, mas quase todas têm o seu final feliz e é isso que espero para todas as que estejam a ler isto. 
Que levantem a cabeça o mais rápido possível e que acreditem em vocês.